SILVA, Salloma Salomão Jovino da. Bio-caminho

salloma Salomão Jovino da Silva, "Salloma Salomão é um dos vencedores do CONCURSO NACIONAL DE DRAMATURGIA RUTH DE SOUZA, em São Paulo, 2004. por dez anos foi Professor da FSA-SP, Produtor Cultural, Músico, Dramaturgo, Ator e Historiador. Pesquisador financiado pela Capes e CNPQ, investigador vistante do Instituto de Ciências Socais da Universidade de Lisboa. Orientações Dra Maria Odila Leite da Silva, Dr José Machado Pais e Dra Antonieta Antonacci. Lançou trabalhos artísticos e de pesquisa sobre musicalidades e teatralidades negras na diáspora. Segue curioso pelo Brasil e mundo afora atrás do rastros da diáspora negra. #CORRENTE- LIBERTADORA: O QUILOMBO DA MEMÓRIA-VÍDEO- 1990- ADVP-FANTASMA. #AFRORIGEM-CD- 1995- CD-ARUANDA MUNDI. #OS SONS QUE VEM DAS RUAS- 1997- SELO NEGRO. #O DIA DAS TRIBOS-CD-1998-ARUANDA MUNDI. #UM MUNDO PRETO PAULISTANO- TCC-HISTÓRIA-PUC-SP 1997- ARUANDA MUNDI. #A POLIFONIA DO PROTESTO NEGRO- 2000-DISSERTAÇÃO DE MESTRADO- PUC-SP. #MEMÓRIAS SONORAS DA NOITE- CD - 2002 -ARUANDA MUNDI #AS MARIMBAS DE DEBRET- ICS-PT- 2003. #MEMÓRIAS SONORAS DA NOITE- TESE DE DOUTORADO- 2005- PUC-SP. #FACES DA TARDE DE UM MESMO SENTIMENTO- CD- 2008- ARUANDA SALLOMA 30 ANOS DE MUSICALIDADE E NEGRITUDE- DVD-2010- ARUANDA MUNDI. Elenco de Gota D'Água Preta 2019, Criador de Agosto na cidade murada.

terça-feira, 19 de setembro de 2017

Ainda sobre Sampa Negra- Periferia, contracultura e antirracismo.

Texto em construção.
Elaborado para ser apresentado na FELIZS



A cena literária e cultural da periferia sul de São Paulo
Periferias: De vazio cultural à culturas adjetivadas
O nordestino que chega a São Paulo (...), chega a um mundo dotado de uma cultura urbana extremamente pobre, praticamente um mundo culturalmente vazio. (1978) Francisco Wefort

Allan da rosa. Ode a São Paulo. Vão Edições Toro. 2005
São Paulo dos ratos gigantes vomitando cinza
Sertão São Paulo
Marginal , barraco no barranco
Deslizes urbanos
São Paulo paranoia no olhar, metro e CBTU
Latas de sardinha
Lotação lotada, populacho em marcha
Importado blindado
Carinho de mão atrás de papelão
São Paulo samba, forro e poperô.
Ritmo e poesia
São Paulo tua menina já tá fumando
Daqui a pouco engravida
São Paulo Jabaquara, capital do feriado
Onde cai avião e maloqueiro desce pelo ralo
São Paulo é pilantra, sangue ruim
Vala vermelha de casa sem reboco
Inconfundível noite púrpura
Pesada e traiçoeira
São Paulo centro fedido
(...)
“Por mais que nos arrastemos presos ao calcanhares, com antiquados e sectários modos de ver  e pensar um suposto centro hegemônico, irradiando cultura às periferias indóceis, o que desponta a clarividência da cultura e sendo produzida, consumida, agraciada e mantida nos mais diferentes lugares por onde o ser humano se encontra.”
Danilo dos Santos Miranda. Cultura da Convivência- Santo Amaro em Rede. Mapeamento Cultural feito e pelo Instituto Polis e pelo SESC na Região de Santo Amaro.

“Quem cuida se nós somos nós mesmas. É nós por nós. Porque psicólogo nós não podemos contar, que somos cabide de emprego pra eles. Todos que foram ficar com a gente arrumaram um emprego em Brasília. Depois usou tudo que nos falamos como tese e nunca mais se lembraram de nós.”  Vera , mães de maio, dez anos de luta. Em Fala Guerreira número 03. 2016.

“Compreende-se então o prestigio da noção de ciência , esta definindo o aspecto essencial da cultura dominante em contraposição ao não saber  ou não cientificidade da cultura do povo; forma nova e sutil de reafirmar , ainda mais uma vez , que a barbárie em que se encontra o dominado, é apenas uma forma de “incultura”. Compreende-se também por que a ideologia dominante Vê caos e irracionalidade, que permite recuperar essa cultura como exótica lembrança de um mundo extinto , que ser exposta ao turista e ao comprador nas feiras de artesanato, que pode ser exibida como relíquia nos teatros e que pode servir de prova do atraso popular, quando bairro operário adquiri uma fisionomia que aniquila, a uniformidade planejada do BNH.” Marilena Chaui.” Cultura do povo e autoritarismo das elites. 1979.    

NONO uma mentira
 “Disse que li muitos clássicos
Pra fazer parte de uma minoria privilegiada
Depois me senti profundamente ridículo e contra o que tenho de mais bonito: minha verdade.”
Prosando. Agosto de 1983.


Obrigado as organizadoras e organizadores  III Felizs. É muito importante esse painel anual da nossa inserção na malha humana e cultural da metrópole.
Nesses momentos podemos nos encontrar e olhar nos olhos dos velhos amigos e amigas, veicular o que estamos criando e pensando, e sobretudo ativar a memória do vivido e experienciado, falar sobre aqueles que se foram e projetar utopias e futuros coletivos.
Esperei com uma boa dose de ansiedade esse momento poder fazer minhas evocações bem singelas e potentes às prosas e rimas, imagens e poéticas de Jenyffer Nascimento, Allan da Rosa, Daniel Fagundes, Sheila Signário, Sergio Vaz, Emerson Alcalde, Daniel Alexandrino, Jé Oliveira, Jean Lopes, Binho Padial, Priscila Obaci, Adriana Paixão, Carmen Faustino, Maria Nilda (Dinha), Marcelo D'Salete, Silvia Tavares, Carolina Teixeira, Renata Felinto, Maitê Freitas, Antonio Guarany Kayowá Passaty, Racionais, Pavilhão Nove, Tc e Banda Zion, Luis Lumumba  e outras "tantas outras pedras pisadas no cais".
Estamos espalhados pelos territórios que eram os chamados Sertões de Santo Amaro, que até a década de 1930 era um município independente. Suas fronteiras governamentais eram feiras com  São Paulo, Diadema, São Bernardo, Itapecerica ( que incluía Embu Guaçu, Embu das Artes e Taboão). Mas o povo local herdeiros de nativos daqui e de outras paragens nunca aceitaram bem essas limitações. Todo território manteve muitas das denominações anteriores a chegada de europeus e africanos. De tal modo que a palavra Mboy predominou para com alterações para definir caminhos e lugares. Estrada Mboy, cidades de Emeboy (Embu Guaçu e Embu das Artes), Rio Mboy, etc. Do original Kaapo-mato derivou Capão Redondo, desde Ibirapuera e Moema, até os fundões de Itapecerica, há essa herança negada e lembrança renitente.
A tal civilização que prendeu os nativos e os matou, tentando apagar sua memória em nós é que fez erigir um vilarejo pobre entre os córregos afluentes do Pinheiros, Santo Amaro foi anexado a cidade de São Paulo, tornou-se um bairro longínquo do aldeamento jesuíta de Piratininga. Só mais tarde foi ligado ao centro antigo, por uma linha de bonde. Na expansão da modernização conservadora em 1970 tinha adquirido o miolo industrial e administrativo da zona sul. Num quadro de industrialização da grande São Paulo, a região de Santo Amaro passou por um processo acelerado de mudança, algo que os especialistas chamam de modernização produtiva. Industrias nacionais e estrangeiras se instalaram lá em terrenos baratos, acesso fácil a eletricidade e um belo rio onde se podiam despejar livremente sua agua suja e os rejeitos tóxicos. 
Atraídos por oportunidade de trabalho e fugindo as regras residuais da escravidão que imperavam no campo, muita gente correu para cá. Assim vieram os meus e da maioria dos meus amigos que se encontram, ou que pereceram aqui.
Perto de ser libertado pela Lei dos sexagenário (prestes a ser reeditada), minha memória da zona sul tem quase cinquenta anos de extensão. Mas isso não é um balanço, embora boa parte do conteúdo desse texto tenha a ver com afetos, quedas e sonhos. Mas não apenas meus.
Alguns amores-amigos feitos nas fimbrias desse tal santo,  Amaro não tem esse perfil de filhas e filhos de migrantes nortistas, nordestinos, sudestinos semialfabetizados e uma primeira geração de gente pobre que frequentou a escola até final do ensino médio. No nosso círculo principal estão negromesticos filhos de operários da construção civil e empregadas domesticas ou mulheres incorporadas ao exército de operárias de fábricas nacionais e muitas multinacionais de eletroeletrônicos (SEMP Toshiba, ficava na esquina da avenida nações unidas com a João Dias, do lado de lá da ponto)  e materiais farmacêuticos  como a Organon (Rua João Alfredo)  e Squib ( também na Avenida João Dias).
Os químicos, professores e metalúrgicos ergueram sedes de sindicatos em antigas casas de moradia alugas nas ruas centrais. Num certo período lá por setenta, ostentavam orgulhosos seus jalecos brancos e macacões azuis ao saírem em montes da Villares, Engesa, Indisa, Caloi, Metal Leve, Bombril. Paravam nos botecos para tomar um gole sagrado e falar sobre a vida e a política nas beiras da avenida João Dias, Largo do Socorro, rua Suzana, Depois se amontoarem nos pontos de ônibus da praça Isabel Schimdt ou caminharem a pé até a altura dos pontos finais de ônibus.  As viações de ônibus Canaã, Jurema, Gatusa exploram a fundo esse contingente que crescia anos após ano e para tanto mantinham frotas velhas e mal cuidadas, não raro era descer dos coletivos apinhados para esperar um outro mais abarrotado, toda vez que um problema mecânico surgia.
Era um estranho clima onde a miséria e precariedade conviviam lado a lado com uma realidade de efetiva prosperidade e riqueza, muitas vezes não como realidade tangível e concreta, mas como promessa, como estimulo e desafio. Noutras vezes era pura ilusão. Quem como eu viu um morro enorme ser deslocado, toda terra ser retirada e no local nascer de um imenso buraco em poucos mais de dois anos um conjunto de prédios comerciais ajardinados e envidraçados, pensou que de alguma forma essa proeza tecnológica, empresarial e arquitetônica  podia ser incorporada em nossas vidas. Mas, um pouco mais tarde descobrimos que não. Não éramos passageiros mas sangre drenado, ou no máximo espectadores da nova modernidade.
Meu irmão mais velho veio especialmente de Minas para ajudar meu pai a construir um barraco de quatro cômodos no terreno que compramos na beira do grande terreno de mata rala,  onde hoje é o cemitério do jardim São Luís. Entre a nossa casa e o tal Centro Comercial de São Paulo foi construído também esse cemitério que é um registro material da perversidade do sistema estrutural naturalizado que rege nossa sociedade. Meu pai combinou com o mestre de obras conhecido seu, que, por uns trocados nos fraqueou a entrada na obra com um caminhão para retirar as placas de madeira industrial que serviam para formas de concreto, agora seriam as paredes da nossa casa. Em duas semanas de trabalho lá estava nossa casa com telhado de amianto, piso de cimento queimado e banheiro dentro. Saímos do aluguel, que alivio, agora tudo iria melhorar.
Em 1997 empolgados com mudanças que chegaram ao bairro, o asfalto havia sido estendido do Largo do Vaz de Lima até o ponto final do Parque Santo Antonio, como haviam poucos carros na área, ao menos incialmente podíamos andar de carrinho de rolimã, bicicleta e jogar futebol vôlei na avenida. Montamos um grupo de jovens na Igreja a convite do capelão amigo de dona Maria da Paz Gomes. Uma professora da literatura nos forneceu um texto de um tal de Aloisio de Azevedo, chamado Juiz de Paz na Roça, por nossa conta e risco memorizamos o texto e fizemos uma semana de apresentações na escola cobrando ingresso, foi um “sucesso total de público e crítica”. De tal forma que dali formamos também um grupo musical. Baianos, Baiola, Tinhola, Inhola Trio e surgiram algumas canções autorais.  Nosso mentor era um padre Franciscano que morava em um seminário, que chamávamos Chácara dos Padres, situado na única área verde do lugar, vale belamente arborizado entre o Parque Santo Antonio e o Jardim Vaz de Lima.
Antes de 1976 não havia nenhuma escola de ensino médio do lado de cá das pontes de Interlagos, Socorro ou João Dias. Na região de Cidade Ademar e Jardim Miriam só o Colégio estadual Martins Pena. Quem podia ter o “luxo” de estudar até esse nível, tinha que buscar uma vaga nas concorridas  escolas de Santo Amaro (Plínio Negrão e Alberto Conte), Chácara Santo Antonio (?), Brooklin (Osvaldo Aranha e Ênio Voz) ou Itaim Bibi (Costa Braga e Costa Manso). Escolas públicas estaduais que em geral ficam nas áreas próximas a extensa avenida Santo Amaro. Havia um sistema seletivo social-racial conhecido como Vestibulinho, que consistia em provas e entrevistas, típica da impessoalidade de nossa meritocracia. Logo, poucos e raros eram as pessoas negras e de traços indígenas que ingressavam nessas escolas.   
Ainda assim essas escolas tinham um papel imprescindível não só escolarização mediados moradores da região como também na produção e circulação artístico-cultural. Grupos de teatro estudantil, festivais de música, cursos, encontros e oficinas eram realizadas por professores, alunos, padres e ativistas de artes em fins de semana. Um grupo de alunos do Osvaldo Aranha que ingressou no ensino médio em fins dos anos 1970 foi especialmente ativo na criação de círculos de cineclube e organização de festivais de música. A premiação era conseguida com lojista da região, roupas, instrumentos musicais, equipamentos de som e algumas circunstancias até mesmo dinheiro.
 Também nos Colégios Estaduais Enio Voz e Alberto Conte grupos de agitadores culturais ajudaram a formar muitos dos educadores e ativistas que mais tarde atuaram na gestão pública regional ou mesmo fizeram carreiras acadêmicas de algum prestigio. Eugenio Vinci de Morais ( linguista formado pela USP) e Jair Guilherme Filho pesquisador e artistas plástico reconhecido no meio artístico e cultural, professor e vídeomaker José Carlos Passador (Passaty) são oriundos desses quadros temporais, culturais e geográfico-afetivos.
    
Um dos primeiros grupos de teatro da região surgiu em 1980, por inciativa de diretores da associação de funcionários da Farmacêutica Organon os artistas recebiam uma ajuda de custo para desenvolver formação técnica e criativa com os trabalhadores. João Lourenço e Marilena Lourenço, tanto atuavam nessa frente de teatro fabril com mantinha outro núcleo composto quase somente de parentes, entre os quais José Carlos Loureço, Ana Frank, Francisco Lourenço e Marco Antonio Loureço e amigos de escola. O pai operário era um músico diletante e que infundiu no filhos um interesse especial pelas artes.  Esse grupo dos Lourenço não mais ativo, agregou inúmeras alunos das escolas de ensino médio da região e durante um longo período utilizou como espaço de trabalho e apresentações o anfiteatro do Colégio Vocacional Osvaldo Aranha.
Há notícias de que um operário sindicalista altamente intelectualizado vindo de (Pernambuco) chamado Fernando do Ó, que fora ativista da Liga Camponesa e dos Centros de Cultura Popular (CPD) da União nacional dos Estudantes (UNE) também teve ações nessa linha de criar grupos de arte e teatro nos sindicatos e fábricas. Embora o tenha conhecido em fins da década de 1980, não tive oportunidade de falar com ele nesse sentido. Nesse mesmo sentido há depoimento esparsos sobre ação de padres e freiras que utilizaram técnicas de Augusto Boal como recurso pedagógico-político, naquela perspectiva de trazer “consciência” aos trabalhadores.
Contudo a mais longa trajetória no sentido de criação teatral na região é aquela mantida na cidade do Embu das Artes pela família Trindade. Podemos mesmo vislumbrar um trabalho sistemático e contínuo que abrange toda região sul e sudoeste da urbe com apresentações e formações culturais em espaços públicos, privados e ongs.
Solano Trindade e sua esposa Margarida Trindade é quase um casal mitológico das artes e da intelectualidade negra brasileira, da primeira metade do século XX. Ligados ao Partido Comunista, foram amigo pessoais de Gilberto Freyre, a quem ajudaram a organizar o primeiro Congresso do Negro Brasileiro em Recife em 1934. Solano migrou para Rio nos anos 1940, e, de certa maneira, fez parte da cena dos primeiros debates nacionais sobre a singularidade das artes negras no Brasil. 
Segundo sua filha Dona Raquel, Margarida Trindade era responsável pela preparação de atores e transpôs para as pedagogias e terapêuticas do Teatro Popular organizado pelo casal, muitas das danças e musicalidades afro-religiosas, teatros, narrativas corporais e orais do nordeste, como Maracatus, Caboclinhos,  Cocos, etc. Embora apagada da memória oficial de psiquiatra Nize da Silveira, Margarida, como assistente social e terapeuta foi uma de suas principais assistentes e aplicou parte de seu conhecimento artístico nas práticas médicas da renomada pesquisadora. 
Solano migrou para São Paulo em meados da década de 1960 e no final dessa mesma década             dois filhos do casal Trindade, Liberto e Raquel se fixaram na cidade, ao lado do pai, primeiramente no Bexiga, depois no Bairro  Ferreira na fronteira da Vila Sonia com Taboão da serra e por fim em Embu das Artes, num período em que Embu e Itapecerica eram para os pobres cidade dormitórios e para o ricos uma região para construção de Sítios de Inverno.  Famílias  abastadas  e de intelectuais renomados construíram seus chalés em modelos europeus na região para desfrutar do ar puro e da mata atlântica nos arredores da metrópole Sergio Person, Gontran Neto, Lívio Abramo, Iraci Nitche, etc.
Solano embora fosse artista conhecido no meio e gozasse do prestígio junto aos grupos engajados das comunidades negras do Rio e de Janeiro e São Paulo, seu caso era um tanto  diferente. Chegou ao Embu não como os outros migrantes procurando fugir aos alugueis mais caros, mas havia sido convidado por Assis, um amigo escultor já instalados na cidade e logo foi reconhecido por outros artistas, que também buscavam alguma visibilidade no mercado. Sua experiência em transitar e fazer mobilizações com diferentes círculos adquirida em Recife e no Rio ajudou a identificar uma tendência de qual é hoje chamado de turismo cultural urbano.
Efetivamente foi ele quem ao passear pela cidade e buscar na memória os discursos sobre arquitetura colonial, e observar os imóveis tombados e outros abandonados pela municipalidade, entendeu as possiblidades de alçar a cidade do Embu a um tipo novo de protagonismo, em plenos anos de chumbo e também da “Campanha Nacional de Defesa do Folclore” e do patrimônio cultural brasileiro. Não há dúvida de que sua liderança foi imprescindível para tal ascensão de Embu, de vilarejo semi-rural decadente nos anos 1950  (tal como foi interpretado por Maria Laura Ferreira de Queiros), ou cidade dormitório em 1970, à polo turístico da grande São Paulo na década seguinte.
Raquel assumiu o legado da família Trindade e manteve ativo um projeto criado por Solano em São Paulo e o fez seguir adiante nos últimos 40 anos. Aquilo já havia sido desenvolvido por seus pais foi ampliado no leque de relações e nas linguagens, ministrou aulas na UNICAMP e trabalhou com vários grupos de culturas negras pelo país.   Um projeto de lei estadual e a colaboração da prefeitura permitiu a construção de uma barracão de alvenaria, sede da companhia e de outros grupos que gravitam em torno do trabalho da família Trindade.
 Seus filhos e sobrinhos e netos também tem  tido um papel importante na região. Especialmente sua sobrinha  Katia Trindade, filha de Liberto e seus filhos Vitor Trindade e Dadá Trindade  também desenvolveram novos repertórios a partir do vasto conhecimentos teóricos e práticos referenciados nos saberes familiares e  do espectro amplo das afro-brasilidades. Vitor tem sido seguido por seus três filhos Zinho, Maria e Manoel, cada um com seu trabalho autoral em diferentes vertentes da cultura artística, seja na música, comunicação ou  performance.        
Ao longo do final do século XX, grupos e indivíduos deram  origem a diferentes projetos e ações culturais na região. Grupos de teatro, dança, música, literatura, circo, multilinguagens e até mesmo de cinema e vídeo  emergiram e cindiram ao calor e velocidade da máquina de triturar corpos e sonhos, vidas e produtos que se tornou a metrópole. Se formos pensar em termos de teatro e dramaturgia na região podemos certamente ver nos irmãos Loureço e a na família Trindade dois antiexemplo dessa volatilidade cultural. Quando trabalhamos com abordagem de criação cultural não hegemônica, seja marginalizada, segredada ou desprestigiada socialmente parece mais interessante estar atento as práticas coletivas ou individuais das quais se possam no longo prazo compreender ou deduzir os processos e acompanhar as mudanças conceituais, políticas e estéticas.            
Voltemos então para contexto que estamos tentando visualizar, para entender os deslocamentos geográficos e artísticos que gostaria de mostrar. Fábricas de grandes empresas nacionais e estrangeiras foram se instalando principalmente as margens do Rio Pinheiros na beira da qual se estendeu uma linha férrea e uma larga rodovia. No início dos anos 1970 o parque industrial de Santo Amaro já se estendia desde o limite da Represa Bilings até as margens do córrego Zavuvús, nas imediações do bairro que era conhecido como Brooklin Novo.
Sergio Vaz me contou que sua família também veio de Minas e se instalou por aqui em 1971. A família Jovino também chegou aqui em 1971, fomos morar na Vila Santa Catarina e depois no Parque Santo Antonio. Nós viemos em busca dessa prosperidade prometida pela modernidade e industrialização. Encontramos aqui gente vinda de todo Brasil com o mesmo afã, melhorar de vida, prosperar. Alagoanos, cearenses, piauienses, paraibanos, mineiros de diferentes regiões e cidades, homens e mulheres cujas vidas conhecemos relativamente bem, e que  passaram ser chamados de baianos, preconceitos mesmo de paulistinhas pobres e periféricos. Nossa vida então começou a gravitar em torno das ruas que saiam de um quadrilátero de casas baixas, cujas janelas se abriam para a rua.  Lá perto da praça Floriano, Isabel Smith, do colégios Paulo e  Alberto Conte, próximo daquele largo que foi remodelado por volta de 1890 para  manter viva a memória da abolição da escravatura. O largo 13 de maio.
Acho importante falar dessa nossa história-memória pessoal, familiar e coletiva entrelaçada a da zona sul como parte de um processo social de construção da cidade de São Paulo, ou a partir dessa experiência de migração, integração marginal numa sociedade racista, elitista e extremamente hierarquizada. Nossa condição de participação naquela que é a maior concentração urbana e também de riqueza, armamento, poder político e consumo cultural das Américas.
Isso não feito de forma alguma para sustentar a ideia de que somente a partir dessa perspectiva que se pode falar, pensar e refletir sobre aquilo que nos propomos aqui, qual seja, tomar a produção artística cultural da zona sul e aumentá-la, criticá-la e compreende-la  a partir dos seus próprios contornos. O fato de estarmos aqui agora só pode ser compreendido na medida em que consigamos olhar para o nosso passado imediato e,  se for possível, identificar os fios narrativos de um processo histórico extremamente rico e pouco conhecido até mesmo por nós. Justamente porque a história e memória da nossa classe social e do nosso grupo entico-racial tem sido ocultado e desprezado por aqueles intelectuais que tradicionalmente são designados ou se ocupam em escrever as narrativas e erguer os monumentos que, em tese, deverão resguardar do esquecimento, para posteridade a história das sociedade brasileira, paulista e paulistana.
Efetivamente não são essas as únicas formas que temos para fixar alguma coisa da nossa experiência e ao mesmo tempo valorizar as vivências e lutas, daquelas e daqueles que vieram antes de nós e apontar um caminho de dignidade para quem há de vir depois. Então ofereço essas reflexões a três amigos negros chamados Daniel, que viveram, criaram e morreram nessa cidade.  Daniel Koteban, Daniel Reverendo e Daniel Marques Sundiata, Saravá.
Dos três mencionados, Daniel Koteban fundador do grupo cultural afro que leva esse nome, foi com quem mais convivi, quando faleceu, estávamos prestes a configurar um trabalho conjunto, baseado nos contos orais-musicais malinkes da figura histórico-mítica  de Sundjata Keita. ( Consulte texto sobre ele no blog)
Podemos brincar com falsas atitudes de rebeldia e afronta, mas a coisa não é brincadeira. Temos na verdade, para nossa tristeza e para constatação da nossa fraqueza ante ao mundo que nos domina, uma lista interminável de nomes cujas mortes prematuras, revelam tanto nossa força espiritual para suportar e seguir adiante, quanto a fragilidade da nossa existência, tanto individual, quanto coletiva nessa cidade e nessa sociedade.
Guardo comigo dois materiais que me acompanham desde a década de 1980. Agora servem para estabelecer um marco temporal sobre o tema da nossa conversa.  Um é um disco realizado em 1988 aqui na parte nobre da zona Sul, chamado Negros africamos. Estava relacionado com a Campanha da Fraternidade daquele ano e foi realizado por músicos negros e periféricos que atuavam com música autoral desde meados dos nãos 1970. A Igreja católica que tanto se beneficiou bastante da pobreza, tráfico e escravidão, fez uma campanha nacional, reconhecendo sua participação nesses processos mais antigos e pedia perdão ao que ela chamava de Povo Negro.
Outro material é um brochura de um poeta chamado Nono, que morava no Grajau e participava de um circuito de pequenos shows, encontros poéticos, ativismo sindical e movimentos sociais ligados a (CBEs) Comunidades Eclesiais de Base. CEBs era um braço da igreja Católica voltada a organização das classes populares e que teve papel muito importante na luta pela melhoria das condições de vida dos pobres.
Hoje sabe-se que também foi uma estratégia da Igreja para conter um fuga de fiéis, diante do crescimento do ateísmo, de adeptos da religiões neo-pentecostais e mesmo da novas adesões as religiões matrizes africanas, que depois de séculos de perseguição começaram a gozar de alguma liberdade de culto e visibilidade. Essa aparente nova condição era devido a um ativismo de artistas como Maria Betania, Gilberto Gil, Leci Brandão, que passaram a explicitar publicamente seu pertencimento, atitude que estimulava uma melhor aceitação.
Nos anos 1970-1980 os poucos espaços onde se podia expressam e em relativa segurança nessas bandas da cidade erma as escolas públicas, sedes de sindicatos, as igrejas, garagens e os quintais. Foi somente por volta de 1984,  sob gestão de Gianfrancesco Guarnieri que a Biblioteca John Kennedy e o Mercado Velho (Casa de Cultura de Santo Amaro) esboçaram sinais de uma programação artística e implantação de atividade formativas.  As escolas publicas realizavam festivais de musica. As Igrejas acolhiam teatro de protesto e conscientização  política dependendo do perfil do pároco e da comunidade.  Os bailes e festas de bairro aconteciam nos quintas e as garagens, mesmo as mais modestas acolhiam os ensaios dos grupos musicais e bandas de rock. O teatro Paulo Eiro, único nos moldes tradicionais da região, passava a maior parte do tempo fechado, pelo menos até por volta de 1989. 
Fico feliz em saber que hoje já não é mais possível acompanhar em tempo real tudo que acontece culturalmente na região, em termos de os eventos, lançamentos, de livros, discos, peças e performances que ocorrem todas as semanas nesse território que vai das margens das representas aos confins de Parelheiros, das beiras de Paraisópolis até a fronteira do jardim Angela com Embu Guaçu e Itapecerica.
É nesse quadro geográfico que os sujeitos sociais que nos interessam se deslocam.  Porque vou utilizar a expressão literatura afroperiférica para me referir a cena que venho trabalhando? Por três motivos. O primeiro tem a ver com a história, o segundo com estética e o terceiro política. Na maioria das vezes não dá para saber onde termina um e começa o outro.
A primeira literatura efetivamente dissidente dos cânones letrados ocidentais a reivindicar tal condição na era moderna foi a Literatura Negra, em pontos diferentes das Américas Negras isso ocorreu de forma quase simultânea.  Não raro os filósofos negros dessa nova atitude cultural aproveitara muito bem, as rotas cosmopolitas do atlântico negro para tecer criticas globais ao racismo antinegro que transmutava para as usas formas mais agressivas e abertamente sangrentas, desdobrados me regimes de segregação e criminalização raciais em diferentes pontos das Américas e da África negra. Alguns desses literato-ativistas estavam em franca articulação do Caribe (Guilien e Mister Gibb) para o Brasil, dos Eua para o Brasil (Katerine Duran e verificar no Quilombo).   
Embora tenhamos rupturas no campo da expressão literária ocidental que se impôs ao mundo através da expansão do ocidente, são rupturas com continuidade histórica e estéticas. No Brasil na segunda metade do século XIX, um poeta negro que havia sido conduzido a escravidão de forma fraudulenta, foi o primeiro no mundo ocidental a introduzir de forma proposital palavras africanas na sua poética para estabelecer um contraste linguístico  entre a herança ocidental a qual ele fora escolarmente educado e as formas linguísticas africanas, cujos falantes eram  facilmente acessíveis no século XIX. Quero dizer que Luis Gama tinha plena consciência do choque estilístico que produzia ao introduzir palavras da tradição oral dos seus ancestrais na escrita combativa que elaborava e difundia.
Numa sociedade brasileira escravagista do século XIX, onde a primeira distinção entre os indivíduos era feita de uma combinação entre cor da pele e condição social, Luis Gama era bem consciente da fragilidade da sua condição de homem negro (e outros como ele), cuja condução ao cativeiro, foi possível porque a lei e ordem era dominada e manipulada de acordo coma as circunstancias por homens brancos possuidores de gentes e coisas.
Suas ousadias foram duas, enfrentar homens poderosos e incluir as relações de poder e termos e pensamentos africanos na sua poética. Conquanto tenha sido enterrado como herói do abolicionismo republicano paulista e transformado em nomes de rua ainda no século XIX, sua poética foi enterrada junto com ele. Como herói poético dos negros os acadêmicos elegeram Castro Alves e elaboraram projetos de visibilidade de sua obra, que até hoje nos enche o saco. Para Castro Alves o negro é outro. Luis Gama viu a si mesmo como negro, como a inda construiu um altar para cantar a mulher negra, que somente 50 anos depois foi retomado por Solano Trindade.
De certa maneira o nascedouro de uma literatura negra no Brasil foram duas figuras contemporâneas na segunda metade do século XIX, Luiz Gama e Manuel Querino, um escravizado tendo nascido livre o outro tendo nascido livre de pais escravizados. São duas vertentes de escrituras afirmativamente negras. Há ainda outros homens negros letrados na segunda metade do século XIX, mas se pode dizer que tenham reivindicado como esses dois uma posição política contra o escravismo e buscado afirmar sua origem africana por meio das escrituras.
Tanto a Frente Negra Brasileira, organização social e partido política, como o Teatro experimental do Negro constam como organizações negras imprescindíveis e pioneiras, cujas escrituras podem ainda hoje ser parcialmente localizadas em documentos musealizados, publicações de teses, dissertações e reinvenções literárias e teatrais.
Luis da Silva Cuti produziu um livro belo e denso livro de memórias do Ativistas da Frente Negra Brasileira, José Correia Leite, publicado na década de 1980 pela Secretaria Municipal de Cultural de são Paulo, que é efetivamente um manancial de conteúdos variados sobre a luta e as sociabilidade negras em São Paulo e no Brasil entre os anos 1920 e 1970.    Algo similar foi empreendido pelo grupo Quilomobhoje Literatura. Aliás, o grupo Quilombhoje de Literatura Negra é outro exemplo de longevidade no campo editorial alternativo. Desde 1977 anualmente publica de forma cotizada coletâneas muito significativa pela abrangência, estilo e gênero, contos, poesia, romances, ensaios, memórias e pesquisa histórica, reunindo autores e autora de todo país. Muitos dos escritores mais velhos que hoje circulam pelos Saraus periféricos divulgando suas obras e estabelecendo diálogos com a juventude amante da escrita. Miriam Alves cujas primeiras obras foram publicadas pelo Quilombhoje tem sido figura constante, o literato e pesquisador acadêmico Luis da Silva Cuti também pode ser ocasionalmente localizado na cena.
Não sei se estes fatos poderiam alinhavar intercâmbios estético-políticos diretos e concisos entre os Saraus e a literatura periférica e a produção literária negra já apreendida por Roger Bastide nos anos 1940 e um novamente desenvolvida por pesquisa crítica de Clovis Moura nos anos 1970. Ainda introduzida na pesquisa acadêmica de autoras como Selma Maria da UERG 2016, .........Contudo podemos falar de uma ou mais base reflexiva resultante da consciência crítica de que a diferenciação cultural é um dado da realidade social, a qual os discursos de homogeneidade da identidade nacional e discriminação cultural de classe, já não podem mais esconder, deslegitimar ou subjugar com a mesma facilidade de antes.           
Os jornais negros da primeira metade do século XX, em muitas ocasiões buscaram figuras exemplares de homens negros que pudessem servir de referências virtuosas as práticas políticas e culturais negras, assim como patronos da luta política, de forma que não pairasse dúvidas sobre a legitimidade das pautas antirracistas e nem sobre a legitimidade da organização pretendida. José do Patrocínio e Luis Gama serão nesses materiais gráficos duas da principais figuras heroicas negras, até pelo menos o início da década de 1950. Quando imaginário negro urbano começara a ser povoado por outras figuras, símbolos e referências. A luta de descolonização na África demandou do ativismo negro brasileiro outras chaves de interpretação do racismo antinegro no Brasil e no mundo.
Ao fim da década de 1960, no meio musical urbano as primeiras canções negras de conteúdos francamente revolucionário foram feitas por homens brancos. São canções como de forte acento blues uma cantada por Wilson Simonal e outra grava por Elis Regina que se distanciada pouco a pouco do Ie-Ie-Ie  e da Bossa branca para assumir assumir uma posição muitas vezes dúbia, mas afastada do conservadorismo político determinado pela ditadura civil militar.
Tributo a Martin Luther King (autoria de ) e Black is beautiful (autores são os irmãos  cariocas Marcos e Paulo Sergio Valle)  introduziram  os temas do poder negro e da luta pelos direitos civis nos EUA. As canções executas em disco, espetáculo e no rádio pareciam tratar de um mundo muito distante do Brasil. Longe das casas de espetáculo de Porto Alegre, São Paulo e Rio de janeiro, onde se apresentavam Elis e Simonal para a classe média branca podia se deliciar com tais canções, sem necessariamente se dar conta do seu conteúdo poético e político contestador. O entretenimento urbano privado era e ainda é um privilégio cosmopolita da classe média majoritariamente branca no Brasil.
O consumo cultural artístico coma bases na noção de belas artes, ainda é cultivado como importante elemento marcador de classe e raça. O cinema e dança passaram ser as linguagens-reduto das elites. Dois episódios polêmicos recentes de ampla repercussão midiática e social envolvendo essas duas linguagens, na cidade São Paulo, podem ser bem ilustrativas desse fenômeno.
Episódio um Dança. Um grupo de artistas afroperiféricos cansados de ver seus projetos rejeitados pela Secretaria Municipal de Cultural quando dos processos de seleção para  definir aqueles que receberiam aporte financeiro para suas produções, resolveram fazer um protesto público. Mobilizaram outros artistas e ativaram a câmara de vereadores que realizou uma audiência pública. Questionava-se sobretudo o conceito de dança contemporânea aplicada pelos selecionadores, que não vinham no repertório dos grupos outsiders elementos estéticos que pudessem ser entendidos como Contemporâneos.  O que a polêmica revelou é que alguns grupos ligados ao balé clássico e as suas variações e cujos diretores tinham relações afetivas, sociais ou políticas com os membros selecionadores, eram anualmente fomentados há sete ou oito anos, sem interrupção.
Antes do surgimento dos Editais de financiamento público, os recursos eram distribuídos no gabinete dos secretários estaduais municipais e de cultural, mediante suas relações e interesses, ou com influência dos políticos tradicionais. A democratização por meio dos editais públicos regraram o acesso, mas não foram capazes de eliminar os vícios de uma classe artística predominante branca e elitista, que se sente uma categoria profissional eleita por deus. Logo tratou de criar novos mecanismo de manutenção dos privilégios, cada vez mais  ameaçados com a relativa democratização dos recursos da cultura.
Durante o fenômeno de ongeirização dos serviços de assistência social na grande São Paulo, algumas entidades introduziram  em seus currículos noções básicas de balé e cursos de instrumentos de orquestras.  Tais metodologias partem do princípio de que os corpos e mentes da juventude negra e periféricos são vazios de valores estéticos dançantes, ou que os valores que carregam são marcados por sexualidade precoce e exacerbada, próprias das classes populares (sexualidade desenfreada gera também muitos filhos, o que é contraproducente para o . Esses estigmas sobre corpos negro-mestiços e pobre tem duas fontes complementares, uma vem da escravidão, o qual o corpo de homens e mulheres escravizadas deviam servir apenas ao trabalho e festa, o prazer e dança deviam ser proibidas.       
         
Na década de 1970, em diferentes pontos do país surgiram escrituras negras, poesia e prosa, jornalismo e romance, musicalidade e quadrinho, dramaturgia e teatro. Em 1974, nos conta Oliveira Silveira, nos conta que em Porto Alegre surgiu o Grupo Palmares, que teria sido o primeiro a formular hipóteses sobre a simbologia de Palmares como uma Republica negra e livre. Embora Palmares conste como enredo de poética e melodia revolucionaria da escola





Salgueiro do Rio de Janeiro em fins da década de 1960 e da escola Vai-Vai em São Paulo em 1973.
De outro desde os anos 1970 para cá tivemos muitas inciativas em termos de uma produção literária negra nos padrões escolares e convencionalmente admitidos, não quero dizer com isso que a produção em si seja tradicional, até pelo contrário, mas grupo Quilombhoje Literatura tem sido a mais longa história editorial brasileira em se tratando de uma temática negra onde se pode observar a manutenção de uma linha de veiculação de criações autorais com recorte étnico racial, cujos parâmetros de qualidade e diversidade, somente comparativos em duas revistas acadêmicas.  A Revista do Centro de Estudos Afro Orientais (CEAO) da UBFA e Revista África do Centro de Estudos Africanos da USP.
Quero dizer que tudo isso compõem algo que estou chamando de Negras Escrituras, ou de Literaturas Afro- periféricas, mesmo quando o suporte a voz, o corpo, o disco de certo autor, ou elaborado em torno de um gênero musical específico, a performance, o teatro, o cinema ou o vídeo. Estas tem sido o resultado e testemunho concreto de estratégias e construções elaboradas à margem do mundo cultural institucional e dominante, são concepções, ideias, imaginários e formas de ser, saber e estar, que os mantenedores da cultura artística hegemônica abominam, combatem, desqualificam e tentam aniquilar, como se trata-se de uma guerra cultural. Para combater aquilo que chamam muitas vezes de forma dissimilada e retorica fugidia de barbárie, incultura ou vazio cultural, utilizando suas ferramentas tecnológicas, tecnocráticas e discursos de poder.
Embora como dois ou mais mundos tensionados e cindidos, não quer dizer que sejam estanques e fechados em termos absolutos. O tempo inteiro tem conteúdos, ideias, valores, sujeitos e desejos  que atravessam as fronteiras relativamente invisíveis e alimentam novas criações culturais em ambos os lados. Noutras vezes as culturas de leite incorporam seletivamente itens das culturas subalternas e logo descartam numa relação que podemos chamar de “exploração negociada”.  

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